Atualizado em 12/05/2022 por Maria Clara
A infecção pela Covid-19 até pode ser assintomática, mas isso não a impede de deixar marcas. De acordo com as informações mais recentes, são aqueles pacientes que tiveram a doença em níveis mais graves que possuem maior probabilidade de ficar com prevalência de sintomas e sequelas após serem contagiados com o SARS-CoV-2.
Pessoas com casos mais leves da doença têm relatado dificuldades nas semanas ou meses seguintes à infecção.
“Ainda não tivemos tempo suficiente para perceber como vai ser esta evolução”, diz Andreia Leite, professora na Escola Nacional de Saúde Pública, que trabalha em um estudo que irá avaliar a persistência da ‘Covid longa’ em Portugal.
“Tem ocorrido grande dificuldade em definir a covid longa”, admite, bem como as sequelas que ficam em uma “condição pós-covid”.
“A condição pós-covid é um diagnóstico de exclusão”, assinala ainda a investigadora. “Se alguém teve covid e começa com determinado sintoma é preciso perceber se é, de fato, a condição pós-covid, até porque existe um conjunto de outras causas para estes vários sintomas, o que torna a abordagem mais difícil”, resume.
A própria nomenclatura de “covid longa” não levanta consensos: um estudo publicado na The Lancet Respiratory Medicine, já no início deste mês, refere que, dado o aspecto de sintomas que podem ocorrer e persistir após a infecção da Covid-19, e também podem afetar diferentes órgãos e sistemas do organismo, “é essencial concordar na nomenclatura e definição” para avaliar a sua incidência, subtipos e gravidade.
“Este processo não pode ser deixado para as agências, prestadores de cuidados de saúde ou investigadores, mas requer vasta discussão, incluindo, nomeadamente, as pessoas afetadas.”
Sequelas e Sintomas
Segundo uma revisão de estudos sobre a ‘long covid’, que estima que as sequelas da doença a longo prazo terão um impacto substancial na saúde pública, existem mais de 50 sintomas distintos relatados pós-infecção por covid-19, sendo os mais prevalentes a fadiga e dificuldades respiratórias, seguidas por perda do olfato e paladar, cefaleias, dor no peito e perda de memória, bem como perturbações do sono.
Confira uma lista de 30 dos sintomas relatados
-Fadiga
-Dor de cabeça
-Dificuldades respiratórias
-Dor de garganta
-Lesões pulmonares
-Dor no peito
-Tosse persistente
-Dor muscular e articular
-Ansiedade
-Depressão
-Insônias
-Dificuldade de concentração
-Perda de memória
-Perda de olfato
-Perda de paladar
-Irritações cutâneas
-Perda de apetite
-Vômitos
-Dor abdominal
-Refluxo gastrosofágico
-Diarréia
-Incontinência urinária
– Incontinência fecal
-Alterações no ciclo menstrual
-Queda de cabelo
-Arrepios
-Suor abundante
-Arritmias e palpitações cardíacas
-Inflamação do miocárdio
-Edema dos membros
A condição pós covid
Bernardo Gomes, médico de Saúde Pública, lembra a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), que considera “condição pós-covid” os sintomas que surgem três meses após infecção, que duram pelo menos dois meses e não podem ser explicados por um diagnóstico alternativo.
Para o especialista, é importante, em termos de sequelas, dissociar aquelas que são efetivamente decorrentes da Covid-19 e outras que possam surgir de circunstâncias de doença mental ou até decorrentes de alterações de estilos de vida determinados pelas medidas pandêmicas.
Segundo os estudos mais recentes, sintomas pós-covid são mais comuns em adultos do que em crianças e mais habituais em doentes não vacinados do que em pessoas que tomaram a vacina.
“E há outra circunstância: pessoas que podem não ter nada na fase pós-aguda e aparecem com quadros, passado algum tempo, que se encaixam na possibilidade de long covid”, acrescenta Bernardo Gomes.
Entre as sequelas mais comuns da Covid-19, o médico aponta fadiga, dificuldade respiratória e disfunção cognitiva. “No entanto, temos outros quadros de afecção do sistema nervoso.
Na prática, as suas consequências traduzem-se em alterações inesperadas do ritmo cardíaco, arritmias, disfunções do sistema digestivo que persistem”. O médico lembra ainda que há doenças cujo número de casos parece ter aumentado no pós-covid, nomeadamente a diabetes, fenômeno que se considera agora estar ligado a uma resposta autoimune exacerbada ao SARS-CoV-2, mas que ainda terá que ser devidamente aprofundado.
“Não jogamos contra um único inimigo, jogamos contra o vírus e as suas questões agudas mas também contra uma reação imunitária exagerada que chegou a causar mortes. E ainda um terceiro inimigo, que deriva do segundo, percebemos que existem reações desreguladas ao vírus que podem ter um eco futuro e não se percebem num primeiro momento”, frisa o especialista de Saúde Pública.
“Infelizmente, vamos tendo cada vez mais casos destes, a expectativa é de que venha muita gente a ser afetada, ainda vai ter um impacto social importante”.
O mesmo diz a investigadora Andreia Leite: “É esperado que haja algum impacto do ponto de vista social e econômico, para além do impacto nos serviços de saúde”, refere, acrescentando que ainda não existe uma “imagem clara” da frequência da Covid-19 a longo prazo e suas sequelas, mas que serão certamente precisos muitos recursos para a “marcha diagnóstica” necessária nestes casos, que incluem a realização de exames complementares.
A professora da Escola Nacional de Saúde Pública lembra ainda que estas sequelas e sintomas do pós-covid são geralmente mais frequentes em doentes hospitalizados ou que tiveram doença grave e, em alguns casos, resolvem-se espontaneamente, mas em outros acabam por persistir “por um período longo e com impacto no dia a dia, na qualidade de vida, na diminuição das horas de trabalho ou obrigando a ter funções revistas”.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, entre 10% a 20% das pessoas que tiveram Covid-19 sofrem de sintomas após recuperarem da fase aguda da infecção, uma condição “imprevisível e debilitante” que afeta também a saúde mental.
E um estudo publicado na eClinicalMedicine revela mesmo que já foram identificados 203 sintomas associados à covid de longa duração e que envolvem 10 órgãos diferentes do corpo humano. O estudo foi realizado com dados de 56 países e envolveu mais de três mil pessoas, tendo concluído que 56 dos 203 sintomas identificados persistiram por sete meses.